Ela
é pequena, é uma pequena dádiva da natureza, nasceu sem saber para o quê,
nasceu sem saber para quando estava prevista a sua morte. É pequena, mas grande
o suficiente para guardar tanta mágoa, tanta desilusão, tanto que possivelmente
ninguém iria suportar metade do que guarda. Um
olhar brilhante como acabado de nascer das chamas, arde cada vez mais, a chama
é difÃcil de apagar; um sorriso como nunca antes visto, algo misterioso, raro
como um diamante debaixo da raiz de uma árvore; cabelos longos e castanhos,
ondulados como as ondas do mar, selvagens como um leão; ela é linda, pequenos
pontos no seu rosto como as estrelas que preenchem o céu durante uma noite de
lua cheia; duas covas, uma de cada lado da sua cara.
Até
parece uma boa descrição, uma rapariga exemplar, o desejo de qualquer um, mas
atenção, o olhar mata assim como as chamas que queimam; o sorriso pode
deslumbrar qualquer um mas é como uma armadilha, as raÃzes desse esconderijo
prendem com tanta força que pode ser impossÃvel de se escapar; os cabelos que
parecem ser lindos e brilhantes como as ondas, podem cegar e simplesmente
afogar; os pontos estrelados do seu rosto determinam o número de vÃtimas à sua
beleza e doçura; e essas pequenas covas, mesmo pouco fundas, são a sua sentença
e da sua maior vÃtima.
É
impossÃvel respirar. Tanta preocupação, tanto desejo, tanta loucura, tanto
prazer na dor fÃsica e emocional. Somos forçados a sentir tudo isto, somos
forçados a viver cada dia de uma forma dependente, a pensar no dia de amanhã.
Como será quando morrer? Nem sempre a beleza e doçura retratam um pedaço de
chocolate, um urso de peluche que apenas nos dá vontade de abraçar. Essa
vontade que temos de agarrar em alguém e fugir é apenas momentânea, agora temos
o coração cheio de amor, como daqui a nada odiamos sentir, odiamos o amor,
odiamos tudo à nossa volta.
Chega
de ser o que não sou, chega de ser esse pedaço de chocolate que derrete quando
entra em contacto com o calor, não posso simplesmente perder a minha forma por
ser pequena. Não me posso iludir quanto aos outros, não me posso perder no meu
olhar quando contemplado ao espelho, não posso deixar que os outros sejam
minhas presas. Presas da minha inocência natural. Não tenho culpa, terei
nascido para isto? Para ser como uma falsa esperança na vida de todos, até na
minha?
Quem
me dera que as minhas lágrimas fossem gasolina para que quando entrasse em
contacto com a chama do meu olhar, queimasse tudo o que há em mim, queimasse a
minha origem, as memórias que criei na vida de todos. Quero passar de uma
lembrança, quero que todos se esqueçam de mim. Não quero magoar mais ninguém,
chega de desastres, para isso estou cá eu.